PORTUCÁLIA

Março 03 2012

Antonio Ribeiro de Almeida (*)

E-MAIL :  ribercor33@hotmail.com 

 

          Se eu fosse um xamã poderia, certamente, explicar o inusitado presente de aniversário que minha esposa recebeu há oito anos.  Era de tarde,  terminara  de aguar o jardim e preparava-me para entrar em casa quando olhei para o portão da garagem.  Surpreso, divisei uma arara que acabava de atravessar a grade e caminhava em direção à porta da sala.  Vinha tranquilamente, com aquele passo meio engraçado, levantando o pescoço e examinando-me de cima abaixo.  Achei que logo ela levantaria  vôo e iria embora.  Isto, contudo, não aconteceu. Entrou pela sala de visitas, e apoiada no seu bico recurvado e nas garras dos pés, foi subindo por uma cortina e dali deu um curto vôo até uma cadeira. 

Minha esposa achava aquilo tudo  muito engraçado, e a gente se perguntava: o que esta arará está querendo ?   Trouxemos uma caneca com água e ela, depois de examiná-la, primeiro com um olho e depois com o outro, foi bebendo aos goles.  Quando tentei me aproximar  deu-me  uma taramelada e me afastei instintivamente.  Quando minha esposa aproximou-se a reação dela foi diferente.  Ficou toda eriçada, abaixou a cabeça para permitir não só o “cata-piolho”, mas que os  dedos da minha mulher acarinhasse   todo o seu corpo.

Achamos que a arara pertencia a alguém da vizinhança.  Antes que alguns amigos chegassem para comemorar o aniversário da minha cara metade, corri todo o quarteirão, casa por casa, perguntando se alguém tinha uma arara.  Ninguém tinha arara. 

          Subindo num cabo de vassoura ela foi levada para um quartinho e ali passou a noite. No dia seguinte abrimos a porta do quartinho, levamo-la até o jardim com a esperança que ela resolvesse voar.  Teimosamente ela ia para o chão e  retornava para a  casa. Mostrou que queria ficar conosco.  Compramos uma gaiola apropriada e ela está lá desde então.  Mostra, e eu não sei por que, uma aversão pelos homens.  Embora eu cuide da “Elvira “ – foi o nome mais feio que imaginei para batizá-la – ela não reconhece isto.  Se  coloco a mão na gaiola vem logo aquela série de bicadas.  Com o meu neto é a mesma coisa.  “Elvira” aceita, contudo, o carinho da esposa e da neta. Elas não aceitaram o nome que dei e a chamam de “Lalinha”.  Parece que ela reconhece os dois nomes.   O máximo de aproximação que consegui foi assobiar e ela responder.  Mas não passa disto.  Ouve, com atenção, quando canto “Elvira escuta os meus gemidos”.  Quando a levo  até meu escritório  fica, pelo que diz minha esposa, resmungando, “Elvira, elvira, elvira ...”   Meio surdo, eu não distingo nada. 

Minha casa sempre foi receptiva aos cães e aos pássaros.  De manhã, num pequeno pinheiro que temos no terreiro, muitos passarinhos pousam e fazem um madrigal.  Até hoje não sei por que a “Elvira” escolheu nossa casa para morar.  Já perguntei a muita gente que diz entender de pássaros e ninguém me explicou a razão desta escolha.  “Elvira”  foi um presente de aniversário que se deu e estamos agradecidos.

 

                    (*) É autor de Contos do Entardecer  

 

publicado por portucalia às 14:11

PORTUCÁLIA é um blog que demonstra para os nossos irmãos portugueses como o governo brasileiro é corrupto. Não se iludam com o sr. Lula.Textos literários e até poesia serão buscados em vários autores.
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