“ SOBRE A CHINA’” OU O ENCONTRO DOS DOIS MAIORES MAQUIAVÉLICOS DO COMUNISMO
Antonio Ribeiro de Almeida (*)
A leitura de "Sobre a China" de Henry Kissinger, editada aqui no Brasil pela "OBJETIVA", em 2011, deveria ser de leitura obrigatória para todos os comunistas - se ainda existem - em Portugal e no Brasil. É preciso que eles joguem fora os seus preconceitos porque as 572 páginas mostram muito bem como era maquiavélico o relacionamento dos dois grandes do comunismo. O livro de Kissinger é todo ele fundamentado em notas registradas ao vivo e arquivadas no Departamento de Estado . A leitura nos mostra como era a diplomacia na China desde o tempo dos imperadores e como os mandarins exerciam uma arte diplomática de fazer inveja aos ocidentais. Adianto a pergunta: Por que a China e os Estados Unidos se reaproximaram ? A China foi sempre vitima do império russo que nos séculos passados havia "tomado" uma parte do seu território como a China, nos anos de Mao, se apossou do Tibete. Mao temia que o Urso (Stálin) formasse uma coligação com os países vizinhos e tentasse em pleno século XX invadir de novo a China. Mao é apresentado e diz não passar de um "professor" e seus diálogos com Kissinger - que fez a primeira viagem secreta - e com Nixon são deliciosos e filosóficos. Ele dialogava de maneira socrática usando frases crípticas, ironia e sempre colocando novas questões. Não temia a agressão soviética e hoje sabemos que sua reaproximação com os Estados Unidos foi feita principalmente em função desse temor. Mao, como jogador de pôquer, argumentava que seu país tinha 600 milhões de habitantes - hoje a China está com 1 bilhão e 300 milhões - e se houvesse uma guerra atômica e liquidasse a metade ainda sobrariam 300 milhões que resistiriam aos soviéticos porque se resguardariam para o interior e acabariam engolindo o exército russo. Kissinger chama nossa atenção para o papel de Zhou Enlai, fiel servidor de Mao por mais de 40 anos, e o verdadeiro artífice da reaproximação. A tal Revolução Cultural, estimulada por Mao com o seu "Livrinho Vermelho", quase que desconstruiu a China, e Mao, ao perceber isto chamou o Exército Revolucionário para acabar com aquela "bagunça". O filme " Balzac e a Costureirinha Chinesa " dá uma boa idéia do que foi a tal Revolução Cultural. O que é mais surpreendente em Mao, nas suas conversas com Nixon é confessar que que preferia lidar com os governantes da "Direita porque eram mais confiáveis" e que ficava relativamente feliz quando as pessoas da Direita chegavam ao Poder. Para mim o capítulo mais revelador de Mao e Kissinger é o da "retomada das relações. " Mao não conseguiu que Stálin devolvesse o território que a Rússia havia ocupado antes da Revolução. Numa das visitas de Mao ao camarada Stálin para negociações o Urso - como o chamava - o deixou uns dois dias sem contato. Depois disto mandou um secretário aconselhar a Mao que desse um passeio pela União Soviética ´para ver as realizações da Revolução. Mao respondeu gracejando : " Não vou passear. " Vim para negociar e vou ficar por aqui fazendo as três coisas que sempre faço : comer, dormir e cagar. "
Finalmente, nas entrelinhas pode-se perceber que Kissinger achava Nixon muito inteligente e sagaz, Ford intuitivo e Carter uma lástima. A reaproximação dos EE.UU com a China só foi concretizada pelo presidente Reagan, um direitista republicano. Enfim, a leitura de " Sobre a China" é que nos dá uma vasta compreensão do que foram os anos 50 e 60 do século XX e porque a Guerra Atômica não foi deflagrada e que as ideologias não contam e entre as nações o que prevalece mesmo é o Nacionalismo.